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Crônica

Autora: Tâmily Prata

 Verifico se tem gasolina: o tanque está na metade. Verifico os retrovisores, ajeito cada um deles, primeiro o esquerdo e depois o direito. Subo na moto mas não tiro o pedal do chão e nem ligo ela. E então começo a pensar se realmente tenho que ir.

 Fico indecisa e começo a fazer uma lista com o lado bom e o lado ruim de ir ou de não ir. Se eu não for, eu vou perder assunto. Mas e daí? Eu posso pesquisar tudo sobre  o assunto na internet, ver videoaula, ler alguma coisa sobre o assunto.   Em algumas horas de pesquisa consigo recuperar a aula perdida. Ou, ou talvez eu simplesmente esqueça e deixe para lá.

Bem, é só uma falta. O que é uma falta pode fazer? Reprovar, falta reprova. Mas mas tem um limite, eu ainda não atingi esse limite. Ou atingi? Talvez seja melhor parar de enrolar e ir para aula. 

 No entanto, se eu ligar a moto eu vou ter que dirigir. É óbvio. Mas se as ruas estiverem movimentadas? Bem, ainda é cedo, decidi ir por uma rua sem movimento mesmo sendo o caminho mais longo. 

Mas, e se não tiver luz nas ruas? Pior ainda se tiver muita luz? Ter muita luz é pior do que a escuridão.  Muita luz confunde  a minha visão, me deixa mais cega do que já sou. É melhor eu não ir! Mas, se eu não for, vou perder assunto!

 Meu Deus, e se tiver uma daquelas pessoas que aparecem do nada ao redor da gente?! 

 Parece que essas pessoas desenvolveram um tipo de teletransporte. Não fazem barulho, eu não as vejo pelo retrovisor, nem na minha frente. Porém, magicamente, elas aparecem ao meu redor. E normalmente elas parecem grudar em mim. 

 Eu sempre me assusto quando isso acontece. Na teoria, significa que a minha mente para por alguns segundos e depois volta a funcionar. Na prática, significa que eu perco o controle da direção por alguns segundos e depois recupero.

Quer saber? Eu não vou! Uma falta não mata. Uma não… mas várias faltas reprovam. É melhor eu ir para aula. 

 Pela décima vez, verifico se os retrovisores estão na posição certa,  verifico o farol, verifico também se as setas estão  funcionando.  Vejo o tanque. Ele está na metade. Testo o freio da mão e o do pé, estão funcionando. Por que não estariam? Vejo a hora no celular. Já é tarde, vou ter que ir pelo caminho mais curto. Penso por mais alguns segundos e finalmente opto por ir, não quero perder conteúdo. 

 Ligo a moto e começo a dirigir. As primeiras ruas não estão  movimentadas. Mas dirijo tão devagar quanto uma tartaruga. Entro em uma rua quase sem movimento, então começo a acelerar um pouco, começo a pegar uma velocidade razoável. Me tranquilizo. Conforme aumento a velocidade, lembro-me que gosto de velocidade, que gosto de dirigir, é legal e um pouquinho… emocionante. 

 Entro em uma rua, essa mais  movimentada, reduzo a velocidade.  Entro em outra rua sem movimento e aumento a velocidade. E então do nada, do nada, aparece um carro bem atrás de mim. Ele cola em mim. Eu diminuo a velocidade novamente, ele diminui também, eu  aumento a  velocidade, ele também, dou seta para esquerda, ele também. Outras motos e outros carros aparecem na rua. Aí eu lembro do verdadeiro motivo da minha enrolação: o trânsito, odeio o trânsito.

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